Ruy Cinatti e Timor: a tese (in)acabada em antropologia
Lúcio Sousa Departamento de Ciências Sociais e de Gestão - Universidade Aberta (DCSG-UAb), PORTUGAL; Instituto de Estudos de Literatura e Tradição - Faculdade de Ciências Sociais e Humanas - Universidade Nova de Lisboa (IELT-FCSH-UNL), PORTUGAL
Ruy Cinatti estudou antropologia em Oxford entre 1957 e 1960. Com a parte letiva concluída, o seu propósito, motivado pelo seu orientador, T.K. Penniman, foi realizar uma tese de doutoramento com o título: The Ecology, History and material Culture of Portuguese Timor, with special reference to the Native Habitat. Para a sua realização esteve, entre 1961 e 1962, em Timor a efetuar trabalho de campo, deslocando-se por todo o território. Terminando esse período era suposto proceder à análise dos dados e à redação da tese. No seu espólio encontram-se vários capítulos em preparação, traduções e correspondência que revelam o empreendimento. Todavia, e apesar dos sucessivos alargamentos de prazo que lhe foram concedidos pela instituição, Ruy Cinatti nunca submeteu a sua tese. Concomitantemente, durante os anos subsequentes à sua estadia de campo em Timor, Ruy Cinatti escreve uma das suas obras mais reconhecidas: Um Cancioneiro para Timor, publicada em fascículos na Voz de Timor em 1968. Apesar de preparado para edição em livro em 1969, como se pode observar nas várias versões disponíveis no seu espólio, a obra nunca foi publicada e só viria a ganhar vida em 1986, um ano após a sua morte. É uma obra que, como refere Jorge Dias no seu prefácio “(...) não é um simples cancioneiro nem mera análise etnográfica.” Esta comunicação pretende explorar os interstícios dessa conjunção híbrida, procurando descortinar a forma como o trabalho de campo realizado alimentou, ao mesmo tempo, as estratégias narrativas da tese e do livro, concedendo ao discurso poético deste último uma autoridade etnográfica e uma reflexibilidade única no contexto dos estudos antropológicos sobre Timor-Leste.